quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

O que é que o português tem? Entrevista com Tiago Nacarato


Carmen Miranda nasceu em Portugal e mesmo assim ninguém fala que não era brasileira. Dizem que voltou “americanizada” depois de uma temporada nos EUA, mas é inegável que simbolizou a voz do Brasil no exterior como nenhuma outra pessoa. Com seus requebros e “balangandãs”, vendeu por anos a fantasia de um país com frutas na cabeça e samba no pé. 

Décadas se passaram desde que a Pequena Notável Tia Carmen se foi, e eis que surge um outro português de alma brasileira cantando nosso país de maneira sensual e arrebatadora enquanto flerta com a MPB, a bossa-nova e o samba. Tiago Nacarato muito provavelmente já apareceu na tela do seu celular/computador em algum vídeo com legendas como “isso sim é que é música boa” ou “um português mostrando que no Brasil existe música de qualidade”. 

Foi interpretando “Onde Anda Você?”, de Vinicius de Moraes e Toquinho, que o jovem de
27 anos chamou a atenção dos juízes e do público na edição lusitana do programa “The Voice”. Em menos de vinte segundos de sua primeira apresentação, sua afinada voz melódica e sua pinta de galã garantiram a ele uma repercussão que sua banda – Bamba Social – ainda não havia obtido. Ao menos não desse lado das águas do Atlântico. 

Tiago é portuense, filho de brasileiros e com família por aqui, onde costuma vir uma vez por ano para rever os parentes e amigos. Seu pai é músico, o que não só ajudou na escolha na profissão (apesar de que sonhava em se tornar jogador de futebol), mas também no gosto pela música brasileira. Só nessa edição do “The Voice”, ele interpretou mais duas canções com nosso tempero, “Oceano” do Djavan e “Diz Que Fui Por Aí” do Zé Kéti (famosa na voz de Nara Leão). 

INTERROGATÓRIO (Vinicius Seixo de Brito): O público brasileiro costuma ser apaixonado de modo caloroso por seus ídolos. O que você achou da maneira que sua primeira participação no “The Voice” impactou os brasileiros? Foi uma surpresa? 

TIAGO NACARATO: O impacto que a minha prova cega teve no povo brasileiro foi sem duvida uma grande surpresa. Não estava a espera que tal acontecesse, muito menos com a força e rapidez com que se propagou nas redes sociais.
Para mim o fato dos brasileiros terem agarrado com tanta força este acontecimento, tem haver com uma certa carência e necessidade da valorização da música popular brasileira e da bossa nova dentro do próprio país. Ver alguém se dando bem com um clássico da bossa
nova fora do país, foi visto por muitos brasileiros como um ato corajoso e verdadeiro que suscitou orgulho naqueles que há muito esperavam por uma ressurreição da mesma.
Hoje em dia, onde a intensidade dos momentos é cada vez menor e que parar para ouvir poesia é quase um insulto ao ritmo frenético da sociedade atual, interpretar "Onde Anda Você" num programa "mainstream" cria um contraponto ao que deveria ser feito numa situação daquelas e isso para alguns tem um valor especial.

Vinicius: O que a participação no programa muda na sua vida profissional? Há mudanças de acordo com os rumos que você estaria planejando antes do programa? 

TIAGO NACARATO: A participação no “The Voice” foi sem dúvida uma rampa de lançamento para a minha carreira. Sem me descaracterizar, mostrou-me ao mundo e fez-me ser conhecido em vários países. Em relação ao rumo nada mudou, continuo com a mesma ideia de música e daquilo que quero fazer com ela. 

Vinicius: Há muita gente ansiosa por sua participação em nossos programas de TV e, quem sabe, até uma turnê por aqui. Existem essas possibilidades?  

TIAGO NACARATO: Apesar do “The Voice” ter sido importante para mim e uma experiência muito interessante em nível de aprendizagem, programas de TV não são o gênero de coisas que eu gosto fazer. Acho difícil voltar a participar de algo assim. Entretanto, turnê no Brasil é um sonho! Mesmo não tendo nada confirmado, o meu desejo é que isso aconteça.

domingo, 17 de dezembro de 2017

EntreVITAS - Entrevista com o cantor russo Vitas para o Brasil

Divulgação/Facebook
Vitaliy Vladasovitch Gratchov, cantor russo de voz aguda e grande alcance vocal que lhe rendeu a alcunha de “Príncipe da Voz de Golfinho” na China. Bem mais conhecido apenas como Vitas, ficou popular especialmente com o público jovem ao se tornar meme no Brasil. O vídeo com uma apresentação sua gravada em 2002 caiu nas graças do público brasileiro e viralizou, gerando várias versões de seus malabarismos vocais.
A princípio, as pessoas pareciam mais interessadas em
Divulgação/Facebook
compartilhar os vídeos e dar risadas do figurino futurista utilizado por Vitas na performance de “The 7h Element”, música na qual ele faz caretas e usa a técnica de “scat singing” (a grosso modo, improviso de sílabas ou vocábulos com ou sem sentido), mas aparentemente, em especial dada a quantidade de seguidores que ele vem angariando, muita gente está levando ele a sério. Muito a sério. A ponto de haver uma espécie de movimentação na internet para que o cantor venha para terras tupiniquins.


Vitas está na ativa com uma agenda cheia – inclusive fará um show de final de ano na China – e considerável sucesso (não como meme) na Rússia e no oriente médio. Lançou sua própria plataforma de rede social, Taingle, esse ano. Nessa entrevista ele fala sobre sua carreira, seus planos e o que acha do frenesi que seus vídeos causaram no Brasil.

INTERROGATÓRIO (Vinicius Seixo de Brito): 2017 foi o ano em que os brasileiros descobriram e começaram a gostar dos seus vídeos. A princípio, como memes. As pessoas achavam engraçado como você se vestiu e cantou a música “The 7th Element / 7 элемент” em seu show em 2002. Depois, o público desenvolveu carinho e admiração por você, muito pelo seu jeito aparentemente tranquilo e por ter aceitado bem as brincadeiras. Você vê as edições que os brasileiros fazem com seus vídeos? O que pensa a respeito desses vídeos?

VITAS: Eu considero os brasileiros como meus verdadeiros amigos. Faz pouco tempo que começamos a ter contato mas já amo o povo brasileiro. Sinto como se fôssemos bons amigos realmente. Sou muito grato pelo fato de que eles estão tão ativamente envolvidos na criação de diversos clipes de vídeos engraçados e de várias paródias que gosto muito.
 
Sou muito agradecido ao Brasil por tanta atenção. E o mais importante, agradeço às pessoas que estão usando tão ativamente minha rede social Taingle e, de forma tão ativa, baixando meu aplicativo, PSY Video. Espero que minha amizade com o Brasil esteja apenas começando. Estou certo de que é algo que durará muitos anos.
 
Vinicius: Em 2011, outro cantor russo, Eduard Khill, também ficou conhecido aqui no Brasil pela maneira que ele cantava, em especial pelo vídeo da música “Я о́чень рад, ведь я, наконе́ц, возвраща́юсь домо́й” (que viralizou com o título de “Trololo Song”). Até então, era a única referência musical russa para muitos brasileiros, por mais que o vídeo dele também não fosse levado a sério inicialmente. Que referências você tem do Brasil? O que você conhece sobre a cultura e o povo brasileiros?
 
Divulgação/Facebook
VITAS: Tenho andado muito ocupado com um cronograma de turnê apertado. Devido a isso, infelizmente não tive tempo para estudar a cultura brasileira. Mas assim que tiver tempo livre, quando eu voltar da turnê mundial, eu quero não só estudar a cultura, quero mesmo aprender português.
 
Vinicius: De uns tempos pra cá, você tem postado bastante conteúdo com mixagens e versões de suas músicas em seu perfil no Facebook (onde está a maioria dos brasileiros que te acompanha). É você mesmo quem posta? Você acompanha a reação do público a cada postagem?

VITAS: Eu tenho uma assistente que é simplesmente maravilhosa, uma verdadeira amiga que eu realmente amo e admiro com grande respeito, Shona Dawson. É ela quem administra a página.

Para que a página seja bem sucedida, e para que meus amigos do Brasil se interessem pelo conteúdo e se divirtam, nós desenvolvemos algo que é bacana, variado e, em alguns momentos, engraçado.

Obviamente, eu sempre acompanho cada publicação nova. Quero agradecer muito aos meus amigos do Brasil, Estados Unidos, Rússia e outros países, mais do que isso: eu quero dizer que me emociono com as respostas nas postagens, e leio quase todos os comentários.
 
Vinicius: Você lançou recentemente uma rede social, a Taingle. O que te levou a criar essa rede?
 
VITAS: A Taingle foi criada exclusivamente com um propósito – unir todos os fãs e admiradores do meu trabalho no mundo todo. Devido ao fato de que em diferentes redes sociais há muitas páginas falsas usando meu nome, eu decidi criar a minha própria rede para os meus fãs, onde podem, diretamente comigo, obter informações verdadeiras a meu respeito.

E o mais importante, eu respondo muitas mensagens que eles me escrevem exclusivamente lá. Eu sempre respondo as mensagens dos fãs.

Convoco todos os fãs brasileiros a se registrarem na minha rede para nos tornarmos cada vez mais próximos. Seria uma grande alegria e uma grande honra para mim.

Vinicius: A criação da Taingle é um projeto paralelo ou uma mudança de rumo na carreira? Quais são os seus planos para um futuro próximo, profissionalmente falando?
 
VITAS: Eu acredito que uma pessoa pode se desenvolver em diferentes rumos. Portanto, tento fazer tantos projetos diferentes quanto possível para dar mais prazer aos meus fãs. Mas isso não afeta meu principal campo de atividades de maneira alguma. Eu realmente gosto de cantar e me envolver com a criatividade, e continuarei a fazer isso por muitos anos.

Vinicius: Muitas pessoas estão fazendo uma movimentação no Facebook para que você venha ao Brasil cantar seus maiores sucessos e mostrar suas habilidades vocais. Há possibilidade de você vir ao Brasil para fazer shows e divulgar sua rede social? Os brasileiros podem esperar para vê-lo numa performance ao vivo?

VITAS: Sim, planejamos ir ao Brasil. Nós temos planos e estamos negociando com várias

empresas brasileiras que trabalham com organização de shows e eventos. Espero que possamos chegar a um acordo para realizarmos alguns shows no Brasil. No momento, tudo está em fase de negociação. Recebemos muitas propostas e temos que escolher, mas para mim o Brasil é um país maravilhoso. Eu gostaria de ir ao Brasil e cantar para os meus fãs. Acho muito importante, uma grande alegria e uma grande honra.
 
Estou muito satisfeito e muito feliz por ter amigos verdadeiros. Novos amigos nesse país maravilhoso que é o Brasil. Quero que minha amizade com vocês nunca termine. Eu realmente amo vocês demais! 

(Entrevista concedida no dia 14 de dezembro de 2017)
 
Links para os dois vídeos do Vitas que o tornaram um meme no Brasil:
 

Sobre a entrevista com o Vitas

Algumas pessoas têm me perguntado como foi entrevistar o cantor russo Vitas. 

A verdade é que eu já estava com as passagens para Moscou em mãos, para apenas uns dias de turista mesmo, e tive um pensamento maluco. "Já pensou se eu encontro o Vitas por lá?", daqueles pensamentos doidos que às vezes a gente tem. Daí me deu um estalo: vou tentar entrar em contato com ele. De repente eu conseguia gravar um vídeo com ele por lá. Ele poderia falar o que ele acha sobre os memes, mandar um alô para as "terras tupiniquins" (essa expressão é muito usada em jornalismo. Tem uma galera que não está sabendo lidar...).

Mandei um e-mail para a produção dele. Eles me passaram outro e-mail. Fui sabatinado quanto a quais seriam minhas intenções com a entrevista. Expliquei. Combinamos que ela seria lançada primeiro na rede social dele (Taingle) e três dias depois estaria em seu Facebook na íntegra. 

Vitas ressaltou que não queria gravar a entrevista em vídeo, que teria que ser em russo e que ele gostaria que eu mencionasse sua rede social nas perguntas. Fiquei preocupado com possíveis erros de tradução, mas fizemos assim mesmo: em russo e via WhatsApp. Acabou dando tudo certo.

Ao final, sugeri que ele gravasse um vídeo mandando um abraço para os seus fãs no Brasil. Ele topou e me pediu para gravar um áudio com a pronúncia correta. Fiz um videozinho tutorial e mandei para ele. Na manhã seguinte, ele postou a sua própria versão - sensualizando em seu melhor estilo - e me pediu mais umas traduções do russo para português.

Mandei um rough/rafe (rascunho, carai!) da entrevista para ele, sem fazer polimento. Ele acabou publicando essa versão mesmo. Aqui no blog eu deixei uma versão lustrada e sem arestas.

Tem gente perguntando "como é conversar com um meme no WhatsApp?" - cara... é... é, né? O fato de que ele não dá entrevistas em inglês dificultou um pouco. Não só pela tradução, porque essa a gente se vira com os vários tradutores online disponíveis, mas mais porque não dá pra desmistificar humores, ironias, sentimentos, reações (não por completo) com respostas escritas em ferramenta de comunicação.

Enfim, foi uma experiência interessante. Levamos três dias negociando. A entrevista foi feita em poucos minutos. Queria mais saber mesmo o que ele pensava sobre o fato de ser um meme, o que achava do Brasil e se tinha planos de vir para cá. Cumpri.

P.S.: também tentei entrevistar a sensação do "The Voice Portugal", Tiago Nacarato. A caminho.